Rio de Janeiro - Por mais de 20 anos, Marisa Xavier Moreira, 55, não teve como comprovar endereço fixo no Morro Dona Marta (RJ). Para receber correspondências ou completar fichas de cadastro, era obrigada a fornecer os dados da associação de moradores da comunidade. Desde o início de setembro, porém, a dona de casa tem uma rua para chamar de sua. De lambuja, ganhou uma reforma nas instalações elétricas de sua casa, além de 18 lâmpadas e dois chuveiros elétricos novinhos em folha. O pacote de benfeitorias veio acompanhado de algo ainda mais importante para dona Marisa: a cidadania, estampada na primeira conta de luz que ela recebeu na vida.
"Ando com a conta na bolsa, porque é meu comprovante de residência. Olha aqui: moro na Rua Diamante Negro", mostrou, empolgada, dona Marisa, que há mais de duas décadas não arcava com gastos de energia elétrica e, agora, terá de pagar, por seis meses, uma tarifa social de R$ 15,72.
A dona de casa faz parte do grupo de 1.452 consumidores residenciais e comerciais da comunidade que receberam este mês a conta da Light, pondo fim aos gatos.
Há sete meses, a Light realiza trabalhos no Dona Marta, para atender às obrigações fixadas no contrato de concessão firmado com a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). De lá para cá, foram substituídas sete mil lâmpadas, mil geladeiras, 500 chuveiros e refeitas 500 instalações residenciais. Ficou no passado o emaranhado de fios que poluía as vielas, impedia a passagem da luz e representava perigo aos moradores.
"A comunidade está mais bonita. A frente de casa parecia um ninho de gato, era uma coisa horrível", disse dona Marisa, que já resolveu colocar em prática dicas de consumo, para não ser surpreendida em março, quando chega a fatura com a cobrança real de consumo.
"Eu falo para os meus filhos: olha a luz acesa, apaga a televisão. Mas o problema maior será no verão, porque já tínhamos nos acostumado a usar o ar condicionado sem pagar nada", admitiu.
Outra rua
A placa na rua da costureira Maria Francisca da Silva, de 67 anos, também é novidade.
"Esta é a Rua das Crianças. O nome sempre existiu, mas não estava fixado", explicou a costureira, que não reclama do gasto extra. "Fiquei 21 anos sem pagar luz, mas isso não é bom. A gente não tem que dever nada para ninguém".
Tarifa social não vale para comerciantes
Durante seis meses, os consumidores residenciais do Morro Dona Marta receberão uma conta de R$ 15,72, referente à tarifa social, válida até fevereiro. No entanto, para os proprietários de pequenos estabelecimentos comerciais na comunidade, a regra, a partir de agora, é diferente: gastou, pagou.
"Como eles têm medidores trifásicos, não entram na tarifa social e terão de pagar o que realmente consumirem", disse Carlos Piazza, da Light, explicando que os consumidores precisam avaliar a situação dos antigos eletrodomésticos e, se for o caso, trocá-los por outros mais econômicos.
Proprietário da padaria Primos, na Rua Padre Hélio 1, Luiz Cláudio Silva dos Santos, de 21 anos, já desligou um freezer, mas a iniciativa não deu resultado: a esperada conta chegou no valor de R$ 1.580,42.
"Para quem não pagava nada, é muito dinheiro. Não tenho como arcar com essa despesa. Corro o risco de fechar as portas", disse ele, que tem quatro funcionários e ainda paga um aluguel de R$ 800.
A dica é economizar
Depois dos trabalhos de reparo de fiação, troca de eletrodomésticos e emplacamento, a tarefa da Light agora é a de conscientizar os moradores a economizar energia. A partir de março, quando terminará o prazo de cobrança da tarifa social, os clientes residenciais terão de pagar pelo consumo da luz que consumirem, sem subsídios.
"Há 20 agentes comunitários visitando a comunidade, tirando dúvidas e dando dicas. Também há uma central de atendimento ao cliente (o telefone é 0800-021-0196)", explicou Carlos Piazza, da Light, acrescentando que a população deve procurar a companhia, em caso de interrupção de energia ou problemas de manutenção.
Agora, com a situação em dia, a dona de casa Marisa Xavier Moreira, de 55 anos, já sabe que, se precisar, não vai pensar duas vezes para acionar a concessionária.
"Cheguei a perder aparelhos, por causa da queda de luz. Mas não podia reclamar, porque não pagava energia, e tinha que arcar com o prejuízo", disse ela, que, agora, recebe a conta de luz em casa.
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